sábado, 27 de fevereiro de 2016

Reflexões...


Eu sei...

 

Por Alessandra Leles Rocha

 

Eu sei que o mundo sempre esteve marcado pelo Bem e o MAL. As páginas da História não me deixam mentir. Mas, eu pensei que o somatório dos erros ou a repetição voluntária deles pudesse algum dia ter fim.

É só o começo de 2016. Apenas dois meses foram cumpridos. Mas, nunca a atmosfera pairando sobre nossas cabeças foi tão pesada, tão tóxica, tão asfixiante. Não, não se tem trégua em momento algum do dia. É só abrir quaisquer veículos de informação para se deparar com cenas da perversidade humana espalhada por cada canto. Perto ou longe de nós, os obstáculos se erguem pontiagudos, ferinos.

Por mais que a economia tenha um papel importante nas nossas vidas, na sobrevivência e manutenção da nossa dignidade, o que mais me entristece é outra deterioração social: a das relações. O modo como o ser humano enxerga a sua espécie é assustador, ao ponto da vida ter sido relegada aos últimos planos de importância.

Seja nos discursos ou nas ações, o fato é que ela parece não repercutir mais significância aos viventes. Mata-se por quaisquer motivos, ou sem eles. A irreflexão diante de uma perda humana nos remete imediatamente aos tempos da barbárie, quando tudo parecia absurdamente normal.

A violência nos tempos da pós-modernidade nos chega rápido e de diferentes formas. Quantos não são os que propagam pelas vias da tecnologia as imagens do terror, até mesmo com requintes de detalhes? Só que a morbidez disseminada, infelizmente não protege nem exime ninguém de ser o próximo. Ao contrário, as maldades do mundo nos chegam a toda hora e travestidas de simbolismos que mediante, ou não, uma leitura mais aprofundada, se consegue extrair entrelinhas ainda mais perigosas.

Bem, a grande nau que nos abriga é uma só, caro leitor. Tentar encontrar razões consistentes e inquestionáveis sobre o massacre fomentado por uma pseudo superioridade de uns sobre os outros é inútil. Os caminhos do poder e da riqueza não têm sido suficientes para construir uma blindagem contra as mazelas que se avolumam por todo o planeta. Basta ver, por exemplo, o que um diminuto, invisível, vírus tem provocado entre nós. O que o dinheiro ou poder tem conseguido de concreto e com rapidez no seu enfrentamento? Contrariando a razão, somos mais frágeis do que gostaríamos. Somos falíveis. Mortais. Reféns do tempo, o impiedoso. E quanto mais se tenta fechar os olhos diante da realidade, ou munir-se de mais arrogância para se manter de pé, mais a humanidade se curva ao irremediável fim de si mesma.

O flagelo da sobrevivência exibe suas faces. Refugiados de guerra. Do clima. Da miséria. Da religião... Quantos mais serão entre nós? Só não se pode esquecer que a dissidência tardia dessa legião de desafortunados poderia ter sido desperta no início dos infortúnios. O silêncio que parece tão nobre e cheio de boas maneiras é perigoso demais; pois, ele mascara, omite os fatos, impedindo as transformações. Então, não há nobreza em se vitimizar diante do silêncio; afinal, todo algoz conta justamente com a alienação do outro. Mas, apesar de tudo isso, a raça humana sempre opta por esperar o insustentável bater-lhe à porta para tomar uma atitude.

Não é à toa que as reconstruções sociais são tão difíceis e se arrastam por longos períodos, em alguns casos infindáveis; sendo sustentadas por ações humanitárias de ‘telespectadores’ razoavelmente informados sobre o processo. O que significa dizer que o fato do distanciamento geográfico, em todas as suas instâncias, impede o engajamento necessário para essas ações se efetivarem de fato e de direito. Portanto, vive-se um eterno ‘enxugar de gelo’ mundial, ou seja, ações mitigadoras ao invés de soluções concretas.

É incrível como a humanidade chega ao Terceiro Milênio com amplas habilidades, especialmente, em criar e fomentar problemas e destruições; mas, com tão pouco ânimo para resolvê-los. Sim, porque não consigo imaginar incapacidade em fazê-lo; dada a sua complexidade morfofisiológica, a qual estará sempre em franca descoberta de suas competências. O que falta é vontade, pois mesmo exposto as mais terríveis conjunturas o indivíduo não se coloca proativo na transformação. Ele hesita, ele espera por alguém que tome à dianteira. Mas, se cada um pensa assim, então...

Desse modo, vamos assistindo ao arrastar dos dias. A espera de um milagre? Talvez. A espera de um sopro de consciência? Quem sabe. O desafio é superar o desânimo que corrói lentamente a esperança, quando a imutabilidade dos fatos é persistentemente real.

O estranhamento é que a raça humana é fruto da inovação, do dinamismo da vida. Se o sangue para de correr nas veias, você está morto. Ou se o ar para de penetrar nos seus pulmões. Ou se os estímulos nervosos se interrompem e não chegam ao seu cérebro.  Portanto, deveria ser difícil participar de um processo social tão letárgico como esse que se instalou entre nós, em que as notícias parecem sucessivamente requentadas ao tempero de sangue e fel.  

É! Eu sei que o mundo sempre esteve marcado pelo bem e o mal; mas... Nem tanto ao mar, nem tanto a terra. Só um punhado de paz, de alento, de alegria, para restaurar as cordas de um coração quase despedaçado. É! Eu também sei que a felicidade é uma utopia; mas, cada pedacinho açucarado dela que colocamos na boca serve sim, de combustível para seguirmos adiante. Pois, como disse o escritor Érico Veríssimo, “Felicidade é a certeza de que a nossa vida não está se passando inutilmente”. Assim, pensemos nisso enquanto o amanhã se fia.   

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